Rio São Francisco/ Sergipe/ Alagoas

Minha viagem por anos planejada!!!! Desde que começou a polemica da transposição do rio São Francisco mantenho esse desejo de ver de perto e ter a minha própria opinião a respeito do assunto; enfim em 2007 consegui subir o rio São Francisco até a foz.
A Bacia do São Francisco tem a seguinte divisão:
Alto
SF – desce a nascente até a Cachoeira de Pirapora em Minas Gerais.
Médio SF – da Cachoeira de Pirapora até a barragem de Sobradinho na Bahia.
Submédio SF – da barragem de Sobradinho até a barragem do Xingó em Sergipe.
Baixo SF – do Xingó ao Atlântico, foz do rio.

Minha intenção era sair de Pirapora e seguir pelo rio quando desse ou pelas cidades ribeirinhas quando fosse necessário, mas passei por semanas de chuva intensa e desisti desse trajeto iniciando a viagem já em Bom Jesus da Lapa.
Daí minha decepção, muitos trechos que não são navegáveis tiveram de ser feitos em ônibus, peruas ou carroceria de camionete em estradas barrentas e cheias de buracos. Persisti no meu roteiro até onde consegui, e achei trechos navegáveis onde segui em cima de “tototós” (aquelas canoinhas a motor usadas pelos ribeirinhos), isso sim foi o máximo. Na verdade eles seguem de uma cidade a outra levando alimentos para venderem ou trocarem, mas embaixo de chuva tudo dava medo, até mesmo de assalto no rio que dizem acontecem muito. Dizem que no trecho de Petrolina, Juazeiro e Cabrobó são onde ocorrem os mais altos índices de violência no Velho Chico.
Atravessei até chegar a Canindé do São Francisco, desse trecho em diante se encontra com mais facilidade as embarcações turísticas, mesmo assim quis ir parte do sertão sergipano por terra para ter mais contato com o povo que são contadores de história maravilhosos. E para quem sempre colocava o tema da transposição para poder ouvir suas opiniões. No caminho descobri a casa de uma senhora que vende doces caseiros e conheci o “doce de pão”, inimaginável!!! Sentei na varanda da casa dela junto ao seu pai, um senhor um pouco surdo que me contou ótimas histórias, fiquei fascinada e nem me preocupei com o tempo.
Chegando a Sergipe refiz minha programação para poder conhecer cidades próximas, segui para Laranjeiras num sábado onde encontrei uma feira maravilhosa, sempre quando viajo adoro visitar mercados e feiras, nesse lugares é que se encontram os verdadeiros nativos e sua gastronomia. É onde somos apresentados as frutas desconhecidas, aos costumes da cidade, tudo é muito sonoro e colorido, descobri a buchada de peixe. No dia seguinte a minha chegada segui numa escuna até o lago do Xingu, a Gruta do Talhado e os Canyons, que são formações rochosas e integram os três estados: Sergipe, Alagoas e Bahia. Ali paramos para um mergulho. Na volta paramos no restaurante flutuante Karrancas’s e me deliciei com uma “pituzada”.
Dia seguinte rumei para Alagoas por terra e me recordei das aulas de história na infância quando se falava em coronelismo. Não é muito diferente nos dias de hoje em áreas rurais do sertão. Também lembrei dos famosos canaviais, por incrível que pareça toda a estrada de Sergipe a Alagoas é ladeado de canavial ou plantação de soja. É um mar de plantação, isso me incomodou muito.
Tive uma péssima impressão quando cheguei a Alagoas, dei logo de cara com uma favela com esgoto a céu aberto. No budismo dizemos que o nosso estado de espírito se reflete na nossa expressão e as pessoas que encontrei por lá expressam miséria, não foi um lugar que me agradou, nem onde me senti a vontade e olha que já andei muito por aí. De Alagoas segui para Penedo, Piaçabuçu até a foz que costuma ser feito com a companhia de um fiscal do IBAMA, já que o delta faz parte da Área de Proteção Ambiental (APA) de Piaçabuçu. Viajei ao lado do comandante porque chovia muito e era a parte mais fechada do barco, isso foi ótimo porque ele me contou muitas histórias dessas idas e vindas no velho Chico. Me mostrou as áreas onde o mar já venceu o rio, as cidades ribeirinhas que estão sofrendo com a dificuldade na pesca, os pontos de paradas dos viajantes no meio do mato, os coqueirais, me contou aquilo que os guias turísticos não contam.
Só o que me faltou ver foram as famosas carrancas que ilustravam as revistas quando se falava das lendas do Chico, dos seres protetores, dos espíritos amaldiçoados. Enfim atravessei o rio sem dissabores mas levando comigo uma riqueza de histórias que não consegui registrar em nenhuma máquina fotográfica mas na minha lembrança. Segundo uma lenda indígena, conta-se que houve uma guerra no norte e os guerreiros do chapadão, onde várias tribos viviam felizes, seguiram para a luta. Eram tantos homens que seus passos cavaram um grande sulco na terra. O noivo da índia Iati foi um dos que partiram para a batalha. Ela chorou sem parar de saudades de seu amor, suas lágrimas caíram de uma enorme cascata, encheram o sulco aberto pelos guerreiros até o norte, até se derramarem no mar...
Cantava o rei do baião: “o rio São Francisco vai bater no meio do mar. Se eu fosse um peixe, ao contrário do rio, nadava contras as águas e, nesse desafio, saía lá do mar pro riacho do navio...”. Luiz Gonzaga faz uma sábia recomendação, a de fazer a viagem pelo avesso, seguindo o curso do maior rio brasileiro até suas primeiras águas.

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